JOSÉ LEITE DA SILVA, mais conhecido como “ZÉ ESTÊVÃO” ou “CAPELÃO”
Nasceu no ano de 1925, no Sítio Macambira, distrito de Guanumby, filho de Estevão Evangelista Cavalcanti e D. Josefa de Andrade Cavalcanti. É mais conhecido como Zé Estevão ou Capelão. Sua família mudou-se do distrito de Guanumby para o de Catimbau, em virtude desse novo local ser abundante em água de minação, pois onde moravam só existiam águas de barreiros, e muitas vezes esses secavam por causa da estiagem. Capelão, como é conhecido popularmente, teve quatro irmãos, sendo eles, Odete, que é viúva e reside em São Paulo, Odália ou Audália que é casada e mora no Sítio Quiridalho, distrito de Catimbau e João Leite, que é casado e mora em Fortaleza (CE) e trabalha como vendedor de uma firma de peças automotivas.
Chegando à Vila do Catimbau, quando “capelão” ainda era menino, seu pai continuou exercendo a profissão de agricultor, e, para auxiliar nas rendas montou uma “bodega”. Quando contava com 17 anos e 3 meses, José Leite foi servir ao exercito na capital pernambucana, junto à 14ª RE. Daqui do município, se recorda que foram seus “colegas de farda” o Srs. Félix Luiz, que atualmente reside no Sítio Fernandes e Félix de Isaías. Conta também, que quando os gritos da segunda guerra mundial ecoavam no mundo e as tropas do exército foram convocadas ele só escapou de entrar naquele rol, porque era muito magro, só pesava 50 quilos e a exigência era para quem pesasse pelo menos 65. Sorte dele!. Ainda quando servia o exército, conheceu a capital pernambucana, ficando encantado com a sua beleza, seus edifícios e suas praias.
Após baixa no exército, José Leite voltou para o distrito de Catimbau, onde um ano e meio depois aproximadamente, conheceu a Sra. Maria José da Silva. Diz que a conheceu em Caruaru, com quem pouco tempo depois veio a contrair matrimonio. Geraram dois filhos - um casal. O menino não sobreviveu a uma doença e morreu logo, não durou nem um ano, enquanto que a menina cresceu, se chama Erotilde e hoje é casada, tem 4 filhos e mora naquele distrito de Catimbau.
Zé Estêvam, como também é conhecido, a exemplo do seu pai, também manteve uma “bodeguinha” na vila Catimbau, que auxiliava nos rendimentos da família. Depois que sua esposa faleceu, por não ter condições de administrar as duas coisas – a agricultura e a bodega, ele fechou o comércio e cuida apenas dos sítios que possui, um denominado Várzea e outro chamado Sítio Aterrado.
Nos tempos que trabalhei no Mercado Moderna, hoje Menor Preço Real, “Capelão” era um freguês certo. Todo sábado, 7 ou 8 da manhã lá vinha ele. Calça arregaçada até perto dos joelhos, botina de couro nos pés, chapéu de massa, bigode gigante e um ou dois sacos vazios com algumas bolsas pequenas dentro. Ele comprava em grosso. Seu cumprimento era dos mais engraçados:- Bom dia pessoal !. Tá todo mundo bêbo por aqui? - Ainda não capelão! - Então tá sem futuro!. Vamos logo aqui no boteco vizinho tomar uma pinga com um pedaço de charque para conversar melhor! E aí saia uns dois ou três empregados para a bodega vizinha, pertencente a seu Chico da farinha, tomava cada um “gole” de Serra Grande com limão e um pedaço de “ceará” e depois voltavam para o mercado para despachar as mercadorias do “capelão”: 30 quilos de açúcar; uma grade de Pitu; duas grades de Coca-Cola; uma grade de Guaraná; meia caixa de sabão em barra; 12 maços de fósforo; 15 caixas de vela; 10 quilos de charque, etc... Conferida a mercadoria, capelão acertava a conta velha e mandava anotar a nova, guardando a mercadoria separada num canto do armazém, dava um passeio na cidade e mais tarde voltava com um carro para pegar suas compras. Freguês certo. Pontual mais do que ponteiro de relógio inglês. Nunca atrasou uma conta.
Certo sábado, segundo a rotina, estava eu arrumando umas mercadorias no armazém e, de repente algo me chamou atenção: um pacote de dinheiro amarrado em uma bolsa de plástico e coberto com papel de embrulho estava no chão, perto de alguns sacos de arroz. Peguei aquele pacote para verificar do que se tratava. Era um monte de notas no valor aproximado de seiscentos cruzeiros. Procurei o Sr. Luiz Nilson, dono do supermercado e apresentei “o achado”. Ele me disse:- Não comente com ninguém, senão vai aparecer um monte de dono. Guarde que depois quem perdeu vai procurar!. Pouco tempo depois lá vem o nosso personagem “Capelão”, todo preocupado, botando as mãos nos bolsos da calça, camisa, cuecão e tudo quanto é canto. Não encontrando na roupa, saiu de cabeça baixa olhando pelo chão, por cima das caixas e por vários lugares. Vendo aquela cena, entendi que aquele pacote lhe pertencia. Então, indaguei:- Capelão, o que o senhor tanto procura?- Meu filho, tive um prejuízo danado. Perdi quinhentos e poucos cruzeiros!. Você viu alguém entrar aqui dentro? Nesse momento fui à gaveta de uma mesa onde havia guardado cuidadosamente o “pacote” e lhe apresentei, perguntando:- É esse? – ao que ele me respondeu: - É esse mesmo. Graças a Deus!. Isso é que é um menino de ouro. Seu Luiz, esse seu empregado é honesto mesmo!...E saiu por ali me tecendo os maiores elogios.
Outra feita ele estava conversando com um amigo e lhe dando um conselho interessante: - Quando você for casar, procure uma mulher mais nova do que você cerca de 8 ou 10 anos, porque se for uma mulher da mesma idade sua, ela vai “sentar o cabelo” primeiro e você vai ficar só na saudade. Essa referência era porque segundo ele, a mulher deixava os “costumes” primeiro e o homem demorava mais. E complementava: - Se não for assim, você vai ter uma ótima mãe de família, uma excelente dona de casa, mas mulher que é bom, zero!.
Quando procurei “capelão” para uma conversa para incluí-lo nesta obra, inclusive tirar umas fotos, soube que ele estava doente e não estava vindo para a cidade. Dois sábados eu desci à praça á sua procura, mas era informado de que ele não havia melhorado. Já me preparando para ir à sua casa na Vila do Catimbau, soube que ele estava na praça. Fui localizá-lo em um armazém na Av. Dr. João Hiecênio Alves Maciel, vendendo uma “carrada” de castanha. No encontro foi aquela alegria dos velhos tempos: -Tá tudo bebo por aqui? - Só brincadeira mesmo, porque ele hoje não bebe mais. Está viúvo e aposentado, mas nunca deixa de trabalhar. Cuida de suas roças como nos tempos de rapaz e nunca está ocupado quando algum amigo quer tirar “um dedo de prosa”. Foi assim neste dia, enquanto descarregavam o carro e pesavam a mercadoria, nos sentamos, ele em cima de um saco de castanhas e eu num tamborete e tiramos uma prosa de uma meia hora de conversa das boas, enquanto Paulo Fotografias registrava o reencontro com algumas fotos.
Curioso para saber o porque desse apelido “Capelão”, perguntei como tudo começou. Ele disse que foi apenas brincadeira dos amigos. Nunca foi capelão de nada. Me disse também que a primeira vez que foi a um cinema foi em Caruaru e o filme que assistiu foi sobre o rei do cangaço – Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião. Tinha entre 28 e 30 anos. Me contou também que o bando de lampião quando passou por Catimbau, sua família ainda morava no distrito de Guanumby, contudo ainda ouviu falar de alguns cangaceiros que passaram por Catimbau, quando sua família já residia ali.
Esticando a conversa, ainda perguntei: - Capelão, você tem televisão em casa?. Ele respondeu: - Sim, tenho uma. Prossegui: - E o que é que o senhor assiste?. Ele disse: - Eu gosto de ver as reportagens e os shows, de preferência música sertaneja, forró, coisa da nossa região. E o Big Brother Brasil?, indaguei. Resposta -O que é isso?. Esclareci: -Esses programas dos jovens que ficam presos dentro de casa 2, 3 meses?. Ele riu e respondeu: - Não dou valor a essas programas de mocidade não!
E assim nos despedimos após um abraço e voltei para minha casa para registrar esse fato, essa lembrança do velho “capelão” que para muitos lembra a figura do grande cineasta “Charles Chaplim” e que em alguns momentos é um excelente tocador de “pé de bode” uma espécie de sanfona muito usada nas festividades juninas.
Antes da despedida ele ainda me convidou, como de costume:
- Apareça lá no meu barraco pra gente tomar pelo menos uma cajuína com um pedaço de pão doce!
P.S. No mês de setembro de 2007 estava em Brasília (DF) participando de um congresso realizado pela Igreja Batista Nacional quando recebi um telefonema do meu filho Lucas (que presenciou a entrevista com Capelão). Ele me relatou com a voz meio triste que o nosso personagem havia falecido no dia anterior. Fiquei muito triste, pois queria render essa homenagem com ele ainda em vida.